Eu começo este diário olhando para o branco do meu calendário. Até poucos dias estava empolgada e aflita com todo o trabalho que teria neste próximo mês. Ensaios, leituras, aulas, performances, tudo parecia muito, tanto, mas também era uma sensação boa de início de ano promissor. Há anos estou desejando um calendário assim, cheio de datas ocupadas por trabalho.
Agora tudo está em suspenso. Sem ao menos sabermos SE e QUANDO voltamos a nos matar de trabalhar, gastar, poluir. A sensação é que o vírus nos obriga a olhar para nós mesmos. “O que estamos fazendo? O que de fato queremos e precisamos para viver?” A notícia de que talvez esta seja uma situação que pode durar meses e meses me tirou o chão. O que será de mim se não houver um outro aqui? Até quando poderia aguentar sem u toque? Se Sartre acha que o inferno é o outro, eu peno que o contrário não é verdadeiro: com certeza o meu céu não está em mim.