Inacreditável pensar que já chegamos no dia 40. Quando tudo começou não sei se algum de nós já se projetava em confinamento pelos próximos 40 dias. Ao mesmo tempo nem me parece que passaram 40 dias. O tempo se estende numa sensação estranha de um único dia. Afinal, o que marca o tempo quando não se há a necessidade social de dividir seu dia em horas, minutos ou segundos?
Eu como quando tenho fome, durmo quando tenho sono, tomo banho quando tenho vontade. Assisto um ou dois ou três filmes de acordo com meu nível de atenção naquele dia. Muitas vezes me assusto ao olhar o relógio: mais tarde do que sinto ou mais cedo do que imaginava. Estou fora do tempo, do compasso, dançando de acordo com meu ritmo interno.
Ontem fui dormir às 3:30 da manhã, hoje acordei 11:30h. E nada disso me pareceu insensato. Ou cansativo. Fiquei até a madrugada cantando, filmando, dançando sozinha… ao som de Raul Seixas, o que me rendeu um bom humor que há tempos eu não sentia. É verdade que não posso deixar de lado o efeito do álcool, que tem uma boa parcela de “culpa” no bem estar desta quarentena.
Em S.O.S Raul canta:
“Hoje é domingo missa e praia , céu de anil
tem sangue no jornal
bandeiras na avenida Zil
Lá por detrás da triste linda Zona Sul
Vai tudo muito bem, formigas que trafegam sem porque
E das janelas desses quartos de pensão
Eu como vetor
Tranquilo, tento uma transmutação….
Oh Oh seu moço do Disco Voador me leve com você para onde você for
Oh Oh seu moço mas não me deixe aqui, enquanto eu sei que tem tanta estrela por aí
Andei rezando para totens e jesus
Jamais olhei pro céu
Meu disco voador além
Já fui macaco em domingos glaciais
Há plantas colossais, que eu não soube como utilizar
E nas menssagens que nos chegam sem parar
Ninguém pode notar, estão muito ocupados para pensar….
Oh Oh seu moço do Disco Voador me leve com você para onde você for
Oh Oh seu moço mas não me deixe aqui, enquanto eu sei que tem tanta estrela por aí…”
Hoje, aqui em São Paulo, é DOMINGO o CÉU é de um AZUL ANIL incrível, uma leve brisa fresca não deixa o dia ser quente demais, não há missa, nem praia, mas tem muito sangue no jornal. Esperançosos, no começo da tarde, que ainda trás otimismo, esses seres humanos todos das janelas dos prédios sonham com a sua transmutação. Algumas meninas cantam aqui do lado, um outro cozinha, as crianças riem e brincam. Cada um encontra a sua salvação, enquanto ela não cai das nuvens.